Autor João Carlos
Quando do lançamento do CD de Kleber, “Canto para um canto”, tive oportunidade de rever um cara que povoou minha infância e adolescência, um homem acima do seu tempo, verdadeiro desbravador, referencia em audácia pra minha geração, Beco de Maria Carneiro, o Dias, como é conhecido em São Luís.
Beco é aquela pessoa que nos faz voltar à Matinha do passado. Saiu de lá a quase quarenta anos atrás, sua mente ainda pensa e vive naqueles tempos. De memórias gostosas, ainda não confundidas pela modernidade que assola nossa cidade. Dotado de uma sensibilidade marcante, nos recebeu gentilmente em sua residência, que mais parece um museu, com as paredes entupidas de quadros, fazendo-me lembrar o livro que atualmente estou lendo, de Chico Buarque de Holanda, “O Irmão Alemão”, onde o autor, escreve que na sua casa, “as paredes eram feitas de livros”. Na casa de Beco tudo respira cultura, arte, retorno ao passado, lembranças.
Recordo-me bem de quando morava em Matinha. Tenho marcado o dia em que inventou uma nova forma de vender bananas: cantando a plenos pulmões aquela musica de Jorge Benjor, que fazia muito sucesso, “Olha a banana, olha o bananeiro”; ou então um inesquecível desfile de moçoilas vestindo biquínis,- um verdadeiro atentado ao pudor para aquela época-, em que ele era o mestre de cerimônias, sem nenhuma cerimônia.
Conversar com ele, além de agradável aos sentidos, é uma volta as pescarias no igarapé de Zezé Veloso; uma ida ao mangal e o palmeiral de Maria Teixeira; o refresco de Flávio Penha; as peladas no campo do Machado; as viagens na lancha de Benedito de Osvaldo, no porto de Canem; os cambos de peixes vendidos por Xuxeta e Valério; as tapagens na Enseada da Mata. Eu poderia ficar horas enumerando fatos e passagens daquele espaço geográfico e temporal, onde Beco morava que nós chamamos de forma jocosa e talvez até um pouco preconceituosa de “lá em baixo”.
Hoje vive em são Luís, mantém um ateliê de reforma de móveis, engrandecendo nossa terra com sua insuperável técnica e beleza na recuperação de quaisquer tipos de sofá, cadeiras, ou outra modalidade. Estando já acima dos 50 anos, – idade em que Platão diz: a sabedoria acontece melhor, e outro filósofo, menos conhecido, o Reverendo Valdir Mariano, diz que já podemos falar o que quisermos, sem medo de chocar os outros-, Beco desfila doxas sobre tudo. Ficou encantado com esse projeto de tentarmos reunir conterrâneos, que estamos querendo colocar em prática, dispondo-se imediatamente a elaborar ideias e devaneios para abrilhantar novos encontros, já fazendo planos para todos juntos, fazermos um piquenique, daqueles de antigamente.
Enfim, conviver com Beco, dá-nos a sensação de estarmos ao lado de alguém rico em conhecimento, e que só nos traz sentimentos belos e saudáveis, capazes de renovar ou emergir reminiscências que aquecem nossa alma, inesquecíveis recordações da nossa querida Matinha.