São Luís do meu imaginário: Reminiscências

“Você está ouvindo a mais poderosa emissora do Norte e do Nordeste do Brasil. ZYF23, ZYF24, Rádio Difusora do Maranhão. 44° 18′ a Oeste de Greenwich, 2° 32′  ao Sul do Equador. Ondas médias, Curtas e Tropicais…”

        Era mais ou menos assim que se ouvia no vozeirão empostado de Fernando Sousa, grande locutor maranhense, o anúncio de que estávamos sintonizados na emissora de maior audiência de São Luís, e do Maranhão, do final dos anos sessenta e inicio dos anos setenta.  As emissões em Frequência Modulada (FM) ainda não haviam chegado à nossa terra. Apenas existiam nos grandes centros do  Sudeste do Brasil. Além da Difusora, havia as Rádios Ribamar, Timbira, Gurupi e, bem depois, a Educadora.

        Além de Fernando Sousa, outros radialistas que fizeram história foram Murilo Campelo, que era piauiense (Rádios Atrações MC), Zé Branco, Guioberto Alves, Herbert Fontenelle, Mauro Campos, Rui Dourado, Leonor Filho, Jafer Nunes, Florisvaldo Sousa… Aos domingos às noites tinham as “paradas de sucesso”, onde se ouviam as 40 músicas mais tocadas durante a semana.  Uma  cópia de um programa famoso das rádios americanas de então (que ainda existem nos dias de hoje, de nome America Top Forty). Épocas de Beatles, Jovem Guarda. Mas as músicas italianas e francesas também estavam nas “paradas de sucessos”.  Ficou famosa a Equipe 680 que comandava as jornadas esportivas da Difusora. Tinha uma música belíssima que era colocada antes, durante e o final das transmissões esportivas.

        Os Times de futebol eram Sampaio Correa, Moto Club, Maranhão Atlético Clube, Vitória do Mar e Nacional. Sampaio, Maranhão e Moto se reversavam nas conquistas dos títulos estaduais. Eu era “boliviano” fanático. Daqueles de assistir aos treinos e saber decorado quem eram os jogadores do meu time. Sampaio e Moto sempre foram os maiores rivais no futebol maranhense. Mas as rivalidades das torcidas se limitavam aos gritos de gol, vaias… Nada de violência de torcidas organizadas. Aliás, essa figura nefasta não existia. É coisa da modernidade.

        Os cursos Ginasiais (últimos quatro anos do atual nível fundamental) e Científicos (três anos do atual nível médio) eram feitos no Liceu, Escola Normal (que funcionava às tardes no mesmo prédio do Liceu e era apenas para moças que queriam ser “Normalistas”. Lembram da música do Nelson Gonçalves?) Escola Técnica. As duas escolas públicas, cujos exames de admissão (espécie de vestibular para entrar no primeiro ano ginasial) eram disputadíssimos. Mas havia também os Colégios Maristas, São Luís, Atheneu. Havia os colégios religiosos. Os católicos eram o Rosa Castro e Sana Teresa (só para moças). O protestante era o Batista que ficava no João Paulo.

        A  nossa patota do Liceu era estudiosa. Lá estavam o Herbert de Jesus, que hoje é poeta, escritor, contista. Os que fizeram Medicina: Maneco, Frazão (já falecido), Gualhardo, Gonçalves de Jesus (Espírita). Ivaldo, Pina (Designer). Érico e o Heliomar Scrivner Furtado (Engenheiros Civis). Eu fiz Agronomia em Belém. Todos nós fomos para o Cursinho Pré-Vestibular do Prof. José Maria do Amaral, estágio obrigatório para quem queria conquistar uma vaga nos concorridos vestibulares de então.

        Um detalhe que chama atenção, vendo os fardamentos dos colégios de hoje, eram os uniformes de todas as escolas de então. De muito bom gosto. A do Liceu no Ginásio (que tinha apenas garotos) era toda cinza. A calça tinha vinco azul claro nas laterais das duas pernas. A blusa no curso científico do Liceu era branca, mangas compridas, com dois bolsos com lapelas. Sobre a lapela do bolso esquerdo se liam as iniciais de Colégio Estadual (CE). Desenhado no bolso vinham uma, duas ou três estrelas. Todos esses detalhes em azul. O número de estrelas denunciava o “primeiro”, “segundo” ou “terceiro” ano do curso cientifico. No pescoço, uma garbosa gravata azul, com o nó bem dado. Uma elegância só.

        Ao final das manhãs, ao terminarem as aulas, descíamos em patota a “Rua Grande” (Oswaldo Cruz) que era a principal rua do comércio em São Luís. Íamos apanhar os ônibus na Av. Magalhães de Almeida. O meu eu apanhava na esquina do Bazar Ferro de Engomar.  Também desciam as garotas dos demais colégios. Era época das minissaias. Ficávamos na torcida para que “um vento buliçoso”, não apenas “balançasse os cabelos” das garotas, como nos versos da bela Toada “Bela Mocidade” do Poeta Donato do Boi de Axixá, mas que também fosse “generoso”  conosco. Íamos à loucura, quando isso acontecia. Bom demais!

        Essa é a São Luís que ficou no meu imaginário. Saí em busca da conquista dos meus sonhos e não mais voltei. Nasci com muita honra no Paricatiua, um belo povoado do município de Bequimão. Mas foi em São Luís que eu me preparei para ganhar  e conhecer o mundo. Aí estão as minhas raízes, as minhas lembranças, as minhas primeiras frustrações…. Mas também estão algumas das minhas maiores alegrias da fase juvenil, convivendo com os meus pais, com o meu irmão, com os meus colegas de bairro e de Colégio. Tínhamos consciência das nossas muitas carências. Mas fomos muito felizes. E também sabíamos! 

*José Lemos é natural de Paricatiua – Bequimão/MA, Professor da Universidade Federal do Ceará, Engenheiro Agrônomo, Pós-Doutor em Economia dos Recursos Naturais e do Meio Ambiente pela Universidade da California, Riverside, CA, USA. Artigo publicado no Jornal O Imparcial do dia 12/05/2018.